Aprendi de ninguém
“Agora, aqui, ninguém precisa de si”. Cantarola Arnaldo
Antunes, na festa, ao final da mesa 17, ou seria 18, 19, no empenho de arrancar
alguns sussurros que fosse da plateia, engessada, aparentemente, de “intelectuais”,
supostamente.
O que posso fazer sem o outro? Para que preciso do outro? E tanto!
Amarrar os sapatos aprendi com o pai. Cumprimentar as
pessoas, com a mãe. Dos irmãos o pedalar na bicicleta, a frear com a borracha
no carrinho de rolemã, o ponto certo do arroz, tantas coisas!
Com a tia o gosto pela mortadela no pão de forma. Com as
crianças da vizinhança a gostar de picnics
(achei que o pic se escrevia separado do nic), aqueles com toalha estendida no
gramado do parque. Na cesta, pão com mortadela, que junto com tubaína marcaram
minha infância.
Com os professores a rezar e agradecer, se, da Escola
Dominical, a obedecer e não resistir se os da escola formal. A abrir, mas
também a fechar a mente. Alguns bons, outros nem tanto, poucos céleres! Raros,
os marcantes! A Benedita que me enxugou o pranto aos sete, à Ivani que me
despertou para as letras, ao Tonny por me dar a chance! À Rovai: “escreva de
novo”.
Mas o tema é o oposto: o que posso fazer sem precisar do
outro?
Não aprendi a me defender com meu pai, a falar tudo com
minha mãe, a fazer direito com os irmãos - sofríamos juntos pelos erros individuais-,
como não aprendi a cozinhar com as tias ou a me soltar, com as crianças. Nem
aprendi com o tio a fazer cara de choro.
Quem me ensinou a chorar? Com quem aprendi a sorrir? De onde
vem meu libertar? Se os tivesse aprendido!
O que posso fazer sem a existência de alguém?
O que posso fazer sem a existência de alguém?
Tic-tac. Tic-tac.
Tic-tac.
Com a Susana aprenderei a nadar? Com Alcidema a colocar a vírgula no certo lugar?
Com a Susana aprenderei a nadar? Com Alcidema a colocar a vírgula no certo lugar?
Pensar, tem o outro. No que penso, para que penso, em quem
penso.
Até na intimidade, podendo só eu fazer por mim mesma,
necessito do fabricante do papel, da louça e da companhia de saneamento, no
mínimo.
Do outro sou refém!
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