Certa vez uma colega do mestrado me deu uma cópia do artigo “Humor, educação e pós-modernidade” de José Sterza Justo, professor da UNESP, que guardei com muitos outros para ler quando tivesse tempo, ou seja, nas férias. Julgando-o muito apropriado, abaixo resumirei e comentarei pontos do artigo agora lido.
O ser humano tem duas expressões afetivo-emocionais básicas:
rir e chorar. O choro manifesta-se como seu primeiro pronunciamento como
sujeito no mundo. O riso aparece depois por volta do segundo mês de vida. Começa
com movimentos sutis no canto da boca enquanto o bebê dorme e daí para frente deixa
claro as sensações de prazer e alegria que o acompanham. Com o tempo torna-se
mais intenso, frequente, culminando na gargalhada da criança.
Imagem: publicdomainpictures.net |
O riso se manifesta no bebê mediante a percepção da figura
humana, ele ri quando visualiza o rosto do outro. “O riso e a alegria, portanto,
acompanham esse acontecimento fundamental e decisivo para a constituição do
sujeito: a descoberta concomitante do “Eu” e do “Outro”...e se estenderá para
outros acontecimentos e relação do sujeito com o mundo”
Claro, nem tudo será harmonioso na vida dessa criança, mas há formas de diminuir o peso das angústias no enfrentamento de conflitos e dificuldades, o emprego do humor.
O humor suaviza o enfrentamento de situações problemáticas e
constrangedoras travestindo o sentido do que está sendo expresso na linguagem e
na interação.
Uma vez estabelecidos os conceitos (mais amplos que essa transcrição
inicial) procurei focar nos aspectos do humor na sala de aula. Geralmente, nós professores
não lemos por ler, lemos para aprender, lemos estudando. Vejam o que encontrei:
“No espaço micropolítico da sala de aula, o humorismo ressoa
profundamente nas subjetividades e nas relações estabelecidas. Pela via do
humor se abre a possibilidade de expressões de ideias e afetos contidos e
policiados, sob o patrocínio de uma atmosfera mais tolerante, licenciosa,
flexível e permeada pela alegria e desenvoltura... A descontração propiciada
pelo riso permite a superação de inibições e maior arrojo do sujeito na
expressão de seus pensamentos e sentimentos e na sua exposição ao grupo.”
O artigo expõe como o humor pode ter também um efeito
maléfico, como na situação do aluno que “não deixa passar nada” e faz
interações cômicas constantes, muitas vezes para provocar o professor, algum
colega ou badernar. São propósitos vinculados à perversão, como nas situações
em que o humor e as piadas são empregadas para desqualificar e ridicularizar o
outro. Esse tipo de humor perverso resulta muitas vezes de preconceito e resulta em violência.
Nota que o humor como instrumento de linguagem e
socialidade (relações que se desprendem das normatizações), se faz presente nos relacionamentos informais, aparecendo mais em
momentos de desconcentração. Na sala de aula, quando ocorrem momentos de desconcentração
e “discursividade lúdica”, fica visível o espírito de comunhão total no riso
largo frente a um gracejo espirituoso. Nesse momento está sendo compartilhado
um sentimento coletivo de alegria.
“A apropriação do humorismo pela
pedagogia é inevitável dentro do quadro atual de flexibilização, expansão da
linguagem... e pode contribuir para retirar dos afazeres de ensino-aprendizagem
aquela atmosfera carregada de sisudez, pesar e sofrimento. O tom de alegria e
desconcentração do humor pode tornar mais prazerosa e divertida a convivência
com os pares na sala de aula e com as tarefas relacionadas ao conhecimento.”
Você já viu como os professores de cursinho pré-vestibular
colocam humor na construção das aulas?
Observa ainda que a pedagogia do humor não
tem como aspirações a disciplina e a sujeição, mas não pode, por outro lado,
significar baderna e falta de compromisso, e também que, a convivência com o humor implica
disposição para lidar com atitudes de subversão criativa da linguagem e das
relações sociais; e é justamente esse sujeito criativo, capaz de transpor
limites que é demandado pela sociedade, mais do que o sujeito reto, compenetrado,
sério e intransigente.
Finaliza orientando que estejamos atentos para
que o humor não se coloque a serviço da banalização, alertando que a cultura pós-moderna é invadida por um senso de
superficialidade.
Não banalize as relações, a alegria não é um sentimento
banal.
Então, está aí minha escolha. Sou movida a
bom humor, muita coisa me anima, o cubo enorme de gelo no suco, o guarda
volumes nas rodoviárias, o colchão na sala abrigando a família como num ninho,
o “melhor bolinho de bacalhau do mundo”, gente do Piauí, SC, MG, SP, gente,
adoro gente. De toda cor. Alegra-me os livros, muitos livros, o mundo dos
livros, os alunos e o ensino.
A frase acima é inspirada em frase da professora Marta Rovai, proferida no Encontro de História Oral, na Unicamp, quando nos conhecemos, que
assim finalizou sua fala no grupo de discussão que coordenava: “Gente é lindo! Será que sou uma deslumbrada?” Como
eu, pelo menos é bem-humorada!
Os temas abordados pelo artigo são muito mais amplos que os
aqui comentados, compilados para o objetivo do post. Vale sua leitura completa
que possibilita outras análises sob olhares variados. O artigo pode ser lido no
link abaixo à partir da página 103.
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